sábado, 19 de fevereiro de 2011

"Eu Sou"


Eu sou Asafe! O Salmo 73 é como um espelho para mim, quando eu leio e me vejo refletido naquelas palavras. Aquela revolta é minha; aquela amargura é minha; aquele turbilhão de sentimentos acontecendo dentro de mim. Como ele eu me alimento de lágrimas, me farto de angústia e me embriago em minha loucura. Faço as mesmas perguntas que um dia ele fez, sinto a mesma dor que um dia ele sentiu. Meus olhos vêem a vida como um dia ele viu, e avaliou e se revoltou. Uma revolta contra os perversos que enriqueceram e se deleitaram na prosperidade ilícita. Uma inveja revoltante contra o mundo, que premia os arrogantes e favorece os ímpios. Enfim, uma revolta contra Deus, julgando minha retidão inútil e vã. Eu sou Asafe ao carregar esse peso, a difícil tarefa de refletir sobre o sentido da vida à luz de tantas injustiças e incoerências. Eu sou Asafe caminhando pelas ruas e esquinas da vida, observando estarrecido que ela, aparentemente, continua a mesma.
Eu sou Moisés! No deserto de sua culpa, no abandono do Egito para viver em solidão a sua frustração consigo mesmo. Ao reler a narrativa de Êxodo 2 sou convencido que como ele eu tenho o coração cheio de boas intenções, mas as mãos manchadas de culpa. Ele assassinou um egípcio, eu matei tantos em meu coração. A fuga foi para ele o único caminho possível; de fugas e esconderijos a minha vida é constituída. É verdade que Deus usou o pecado de Moisés para cumprir seus propósitos, mas isso não o livrou da dor, do sofrimento e da decepção consigo mesmo. Além do fato que ele se sentiu incompreendido pelos seus próprios irmãos hebreus. Quantas noites solitárias, quantas peregrinações diárias foram precisas para que Moisés se reencontrasse! Eu sou Moisés em meu deserto, sou ele em minhas culpas. Peregrino por aí em busca de respostas, muitas vezes sem perspectivas, na esperança de que um dia eu saiba que os meus pecados foram úteis aos seus propósitos.
Eu sou Elias! Quando medito em sua vida narrada no Primeiro Livro de Reis percebo, especialmente no capítulo 19, que o medo que ele sentiu é o mesmo que me apavora. Medo da vida, medo especialmente das consequências da vida, medo do que é certo... simplesmente medo. Não é falta de fé, nem mesmo depressão, é a ferida aberta de minhas fragilidades. Ah! Como eu sou como Elias. Como ele meu primeiro impulso é pensar na morte, na cessação da dor, no fim de todas obrigações. A visão obliterada pelos acontecimentos é a mesma, a incapacidade de ver Deus agindo na história também. Sinto-me na caverna, cansado e desestimulado, Meus argumentos com Deus são lógicos para mim, é a mais pura versão da realidade. Não há mais nada a fazer, nada que possa mudar essa realidade que enxergo. Eu sou Elias, em sua solidão profética, em seu abandono ministerial, em sua luta interna. Eu sou Elias, em sua mágoa com seu povo e sua estima abalada. Eu, também, sou Elias.
Eu sou muito mais, sou Jó em sua calamidade, sou José em sua relação tumultuada com seus irmãos. Sou Davi, sou Pedro, sou João, e muitos outros espalhados pelas páginas da Bíblia. Sou todos e sou eu. Vivo e sinto o que eles viveram e sentiram, mas afinal sou apenas eu mesmo, vivendo a minha história. Mas espero, como eles, aprender a tratar a minha revolta, a minha culpa ou o meu medo. Espero como eles fazê-lo na dependência de Deus, reconhecendo que "nenhum de seus planos pode ser frustrado" (Jó 42.1). Espero entender que o caminho que eles encontraram para vencer os desafios da vida e a reencontrar a alegria da existência foi na oração. Momento em que seja no Templo (Asafe), seja no deserto (Moisés), seja em Horebe (Elias), Deus falará comigo. E em meio às minhas orações direi: "Ouve, Senhor, a minha súplica e cheguem a ti os meus clamores " (Salmo 102. 1).

Jôer Corrêa Batista - meu mestre, irmão e amigo.

quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011

Crentes Incrédulos


Crer em algumas coisas requer desacreditar outras. É extremamente incoerente dizer-se crente e ao mesmo tempo acreditar em tudo. Não se pode sustentar idéias ou conceitos auto-excludentes, e por isso ser verdadeiramente crente em Jesus Cristo implica em ser incrédulo quanto a tudo que contraria sua Palavra.

Sendo assim, em certas circunstâncias, sermos considerados incrédulo não chega a ser uma ofensa. Dependendo de quem fala e daquilo que afirma ou pratica, ser incrédulo perto desse tipo de gente é o certo. É nosso dever manifestar incredulidade para com certas pessoas e suas palavras.

A Palavra de Deus destaca o tratamento dado aos falsos profetas em Deuteronômio 13. 1-3:
Quando profeta ou sonhador se levantar no meio de ti e te anunciar um sinal ou prodígio, e suceder o tal sinal ou prodígio de que te houver falado, e disser: Vamos após outros deuses, que não conheceste, e sirvamo-los, não ouvirás as palavras desse profeta ou sonhador; porquanto o SENHOR, vosso Deus, vos prova, para saber se amais o SENHOR, vosso Deus, de todo o vosso coração e de toda a vossa alma.

Não são dignos de crédito aqueles que conclamam os filhos de Deus para servirem outros deuses. Na Mesopotâmia podia ser mais fácil que hoje para os hebreus distinguirem o SENHOR dos falsos deuses. Mas isso ainda é nosso dever, uma vez que falsos profetas se levantam no meio da Igreja para desviar os crentes. Todo aquele que prega outro evangelho, Paulo é taxativo, deve ser considerado maldito (Gálatas 1. 6-8). Na Antiga Aliança existia licença para matar os falsos profetas, hoje, ainda que vivos, eles devem ser anatematizados pelo povo de Deus.

A Confissão de Fé de Westminster XIV.2 afirma:
Por essa fé o cristão, segundo a autoridade do mesmo Deus que fala em sua palavra, crê ser verdade tudo quanto nela é revelado, e age de conformidade com aquilo que cada passagem contém em particular, prestando obediência aos mandamentos, tremendo às ameaças e abraçando as promessas de Deus para esta vida e para a futura; porém os principais atos de fé salvadora são - aceitar e receber a Cristo e firmar-se só nele para a justificação, santificação e vida eterna, isto em virtude do pacto da graça.

Este texto deixa claro que o verdadeiro objeto de fé encontra-se em tudo quanto é revelado por Deus em sua palavra. Essa fé na prática evidencia que a confiança sobre a justificação, santificação e vida eterna, restringe-se exclusivamente na pessoa de Jesus Cristo.

Crer em Jesus Cristo limita à sua pessoa toda esperança de salvação, sem que nada nem ninguém possam concorrer para este fim. Crer na obra do Espírito Santo significa crer no propósito que o próprio Senhor especificou a seu respeito (João 14.26; 15.26; 16. 12-14), e não em performances solo desconexas da Palavra que Ele mesmo inspirou.
Ter fé na Soberania do Pai é crer que Ele tem pleno poder e sabedoria sobre todas as coisas, ordenando-as livre e inalteradamente de maneira que tudo quanto acontece está sob seu controle, sem com isso afirmar ser Deus o autor do pecado e nem fazer dos homens marionetes (CFW III.1). Crer nas Escrituras é obedecer a tudo que é prescrito como vontade de Deus, e confiar em sua bondade revelada. Isso implica em não crer em nenhuma outra palavra atribuída a Deus que vá de encontro ou acrescente ainda que uma vírgula aos registros canônicos.

De outro ângulo, os verdadeiros incrédulos ainda que se digam crentes em Jesus Cristo, negam, acrescentam ou até mesmo desprezam estas coisas. São assíduos à visões, mas cegos quanto ao evangelho, otimistas e triunfalistas em seus maus caminhos, mas fadados a destruição.