quinta-feira, 31 de dezembro de 2015

Domingo eu preguei - A competência do Pai sobre os tempos, e a nossa sobre o testemunho


Quem já viajou de carro com crianças já teve a experiência de ouvir ad infinitum perguntas como: "Já estamos chegando?"; "Já chegou?"; "Já está perto?". Essa ansiedade é compreensível pela vontade de se verem livres dos cintos e do carro. Porém, essa curioso anseio sobre o tempo de chegada é completamente inútil. Não mudará em nada o trajeto estabelecido, não adiantarão nem tardarão a viagem, apenas tornam as horas mais difíceis de suportar.
O Novo Testamento por vezes compara os crentes com meninos (1 Coríntios 3.1; Efésios 4.14; Hebreus 5.11-13), mostrando que existem casos de atraso no amadurecimento proposto na vida cristã. Esse crescimento não provém do acúmulo de conhecimento teológico, ainda que esteja associado a ele. Creio que a maturidade cristã tem a ver com o equilíbrio que encontramos entre nossa vida com seus desafios nesse mundo, e a confiança depositada na Palavra. 
No último domingo de 2015, expus Atos 1. 6-11, considerando precisamente o antídoto para a meninice de alguns travestido de ansiedade. Como crianças em uma longa viajem de carro, somos tentados a pensar que, de conformidade com nossas projeções, podemos apressar a vinda do Senhor. Todos anos, previsões feitas por otimismo ingênuo, ou por superstições, tomam conta dos dias que antecedem o 31 de dezembro.
Nesse início de seu segundo volume, Lucas vinha falando resumidamente dos últimos dias do Senhor junto aos discípulos sobre a terra (v.1-2). Sua morte e ressurreição foram reafirmadas, e num período de pelo menos 40 dias o Senhor esteve junto deles, tratando de assuntos concernentes ao Reino (v.3). Uma importante ordem é dada então: Que eles não se ausentassem de Jerusalém, mas esperassem até o cumprimento da promessa do Pai, reproduzida pelo próprio Cristo: Os discípulos receberiam o batismo com o Espírito muito em breve (v.4-5).  
Nesse contexto os discípulos o perguntam no versículo 6 sobre o tempo da restauração do reino á Israel, o que, na resposta de Jesus, nos dá a competência do Pai e de seus discípulos: Os tempos pertencem a autoridade de Deus, e a nós a responsabilidade de testemunharmos do Senhor até os confins, até que Ele venha.

1. O que concerne a Deus. A Pergunta trazida a tona reflete um pouco de imaturidade ainda vigente entre os discípulos. Sabemos que o anseio messiânico dos judeus era a restauração do Reino a Israel. Suas projeções os lançavam aos dias do rei Davi, sua glória e poder. Acreditavam portanto que a promessa do Pai os remeteria ao domínio político que um dia existiu. Não posso responder pelo que pensou Jesus, mas sua resposta inicialmente áspera me faz imaginar que não ficou muito satisfeito com o teor da pergunta. Creio que o problema não era tanto a questão do "quando", uma vez que os discípulos já o haviam arguido quanto a sua manifestação (Mateus 24.3; Lucas 21.7), mas a insistência de pensar que Israel estava no centro da promessa do Pai.
A resposta de Jesus a primeira instância nos remete a Deuteronômio 29.29, sobre as coisas não reveladas que pertencem a Deus. Apesar de não negar objetivamente a "restauração do reino a Israel", Jesus deixa claro que o conhecimento de tempos e épocas (chronos e kairós) é reservado  ao Pai por sua exclusiva autoridade. Somos instados nessa resposta a nos recolhermos ao nosso lugar, sabendo que isso não nos compete, mas ao Pai, que detêm, exclusivamente, o conhecimento concernente o tempo e as ocasiões específicas. Muitos se aventuraram ao longo da história da Igreja em tentativas frustradas de prever a vinda de Cristo, ou até mesmo de indicar outros acontecimentos futuros. Esses falsos profetas levaram milhares ao engano, e até hoje arrastam muitos com suas previsões pretensiosas. Essas previsões, quase sempre triunfalistas, criam todo fim de ano expectativas falsas, que caso não seja substituído pela frustração da realidade, são seguidas por uma alienação cada vez maior.Jesus nos advertiu que a estes não podemos seguir (Mateus 24.4-5, 11, 23-26).

2. O que concerne a nós. Mas, graciosamente, o Senhor nos fala com maior precisão sobre a promessa que os discípulos deviam esperar em Jerusalém (v.4). Enquanto o Pai tem exclusiva autoridade (exousia - regência ou domínio), os discípulos receberiam poder (dunamis - força ou habilidade) oriundo do Espírito. Esse poder não é nosso, mas derivado da terceira pessoa da Trindade. O poder alcançado na descido do Espírito sobre eles faria deles testemunhas de Jesus. As implicações disso são distorcidas por muitos nos movimentos pentecostais. O poder e o testemunho de Cristo têm a sua fonte na pessoa do Espírito Santo. O descer do Espírito sobre os discípulos é a promessa do Batismo com o Espírito. Essa promessa do Pai, é ratificada e executada pelo Filho não é uma segunda benção, exclusiva para alguns crentes que buscam mais o Espírito. Assim como João batizou com água, o Cristo batiza com o Espírito, todos os crentes, em cumprimento da promessa do Pai, para o propósito de seu testemunho. Desta sorte, todo crente verdadeiramente nascido de novo, pela obra regenerativa do Espírito (João 3.6) é, a partir do Pentecostes em Atos 2, capacitado pelo mesmo Espírito para ser testemunha (martusde Jesus. Esse é o propósito estabelecido no batismo com o Espírito, a capacitação dos crentes no testemunho (martureo) do seu Senhor (João 15.26-27).

3. Até onde e quando? Enquanto a preocupação dos discípulos era a restauração do Reino à Israel, tem este como o fim, ao menos político, a resposta de Jesus agora nos conduz a um outro alvo temporal: os confins da terra. Jerusalém, a cidade de Davi, onde, das portas para fora (Hebreus 13. 12-14), o Filho de Deus sofreu nossa morte, não era a linha de chegada, mas o ponto de partida. As quatro referências dadas aqui (Jerusalém, Judéia, Samaria, até aos confins da terra) tem seu cumprimento ao longo do livro de Atos (capítulos 2, 8, 10, 19). Mas nesse caso, me chama atenção que os "confins da terra" não é uma localização precisa, mas até onde o evangelho precisa chegar, sendo então todo lugar. A perspectiva do Reino não é domiciliar de uma nação, ou de um povo, mas dos quatro cantos da terra (Apocalipse 7.9). É necessária nossa compreensão disso para não reduzirmos a Igreja a nossa perspectiva, ou tempo. O testemunho de Cristo, que é o evangelho, perfaz a expansão do Reino anunciado. Essa compreensão, histórica e cultural, serve para desfazer qualquer pretensão pessoal no sucesso do crescimento da Igreja de Cristo. A Igreja cresce ao longo dos séculos, nas mais inóspitas sociedades, pelo exclusivo poder do Espírito que transforma homens perdidos, como aqueles discípulos "ensimesmados" em testemunhas de Jesus.
Mas existe um tempo estabelecido para que essa expansão chegue ao seu limite. Ao ser assunto aos céus, os que testemunhavam este evento extraordinário ficaram, naturalmente, perplexos, mesmo após Jesus ser oculto em uma nuvem. Não sei se tinham a expectativa de o verem novamente naquele instante, ou o quê; fato é que anjos surgem para anunciar-lhes que Ele voltaria da mesma forma que partiu, a vista de todos os olhos. Assim como em sua anunciação, nascimento, tentação, paixão e ressurreição, os mensageiros celestes de Deus surgem para falar aos homens sobre Jesus, lembrando-os que Ele voltaria aqui. Não convinha que os discípulos ficassem ali, com torcicolo, a espera de um retorno imediato. Eles tinham o que fazer em Jerusalém, e depois além. Deviam saber sim, que aquele de quem testemunhariam voltará um dia, mas que não antes de se cumprirem suas Palavras quanto ao Fim dos tempos. Pedro nos fala em esperar e apressar a vinda de Cristo (2Pedro 3.12), o que significa não somente o aguardo simples, mas o forte anseio sobre isso. Isso reorienta nossas prioridades, tendo o Reino e sua Justiça em primeiro lugar na ordem de nossas vidas (Mateus 6.33). Especulações infundadas sobre o retorno de Cristo, contribui contra a anunciação do seu Reino, uma vez que confunde aquilo que nos foi revelado na Palavra, com o que pressupões os supersticiosos que desejam fundar seus próprios reinos.

Portanto, devemos ter em mente o que nos foi anunciado sobre a volta de Jesus, mas ao mesmo tempo nossas mãos, pés, e, principalmente, bocas, na proclamação do evangelho. Essa é a nossa competência. Confiar que o Reino estabelecido pelo nosso Senhor, maior que nossas expectativas, tem sua manifestação final e total a seu tempo é um exercício de fé e esperança. Todavia, em nosso tempo, em todo tempo, em dias maus, como os do ano de 2015, ou em nebulosos, como serão os de 2016, devemos nos apresentar como testemunhas de Cristo, capacitados pela pessoa do Espírito que habita em nós, e dá poder para tanto.
Finalizo assim esse texto com as duas últimas estrofes e o coro do Hino 105 do Hinário Novo Cântico - A Certeza do Crente:

Não sei o que de mau ou bem/ é destinado a mim;
Se maus ou áureos dias vêm,/ até da vida o fim.

Não sei se ainda longe está,/ ou muito perto vem,
A hora em que Jesus virá,/ na glória que Ele tem.

Mas eu sei em quem tenho crido,/ e estou bem certo que é poderoso!
Guardará, pois, o meu tesouro,/ até ao dia final.

Deus assim abençoe seus discípulos verdadeiros no ano de 2016, como tem abençoado a toda sua Igreja ao longo dos séculos, até a sua consumação.     

quarta-feira, 23 de dezembro de 2015

O Verbo Encarnado não é o Verbo Encenado


O Verbo Eterno que se encarnou tem alguns concorrentes em sua celebração natalícia. Os homens dividem a atenção entre o Filho de Deus e o "Bom Velhinho". Entre Belém e o Polo Norte. Os pastores e anjos são substituídos por renas e duendes. Os presentes entregues ao menino (ainda que esse evento tenha se dado um bom tempo após seu nascimento) dão lugar aos presentes de amigo oculto. É natural que os homens que amam as trevas ao invés da Luz se deslumbrem com outro enredo distante das Escrituras. Isso vem de longa data, e não se restringe ao Natal, mas é visível na Páscoa, na concorrência entre o "Coelho" e o Cordeiro de Deus.
Mas, seria possível que igrejas históricas também substituíssem a mensagem das Escrituras por encenações e cantatas, ainda que contando a história de Jesus? Infelizmente sim. Sem precisar invocar Papai Noel, ou qualquer outro artifício do comércio natalino, sempre que uma igreja substitui a exposição das Escrituras por encenações artísticas, nega-se o âmago do Natal:
E o Verbo se fez carne e habitou entre nós, cheio de graça e de verdade, e vimos a sua glória, glória como do Unigênito do Pai. (João 1.14)
Não sou contra o teatro em si. Acho válido enquanto recurso didático. Particularmente sou fã dos autos católicos enquanto matéria prima artística, pois são capazes de cativar a audiência e transmitir com simplicidade sua mensagem. Obviamente sou contrário à mensagem desses autos, uma vez que não correspondem a fé bíblica. Com isso, porém, quero pontuar que reconheço uma certa utilidade no teatro, pelo menos para o ensino. O que não reconheço a luz das Escrituras, é o seu lugar no culto público.
O Senhor Jesus nunca fez uso de dramatização em sua proclamação do evangelho. Mesmo após a ressurreição, quando andou com os discípulos no caminho de Emaús, valeu-se das Escrituras para expor-lhes o que havia acontecido (Lucas 24.25-27). Os apóstolos após sua assunção ao céu também não usaram outro dispositivo além das pregações. Na história da Igreja não se viu isso nem na apóstata Roma. A Reforma fez por onde limpar o culto, saindo de uma missa ininteligível, para o serviço a Deus por meio da centralidade da Palavra. E agora o teatro toma lugar do púlpito, o drama rouba a cena da Exposição bíblica. Por que?
Não ouso julgar os corações de todos os que se prestam a esse papel (literalmente), pois sei que, a exemplo dos fariseus, eles podem ter zelo, mas sem entendimento (Romanos 10.2). O que me arrisco a fazer são três observações do que motiva alguns crentes no presente século, filosófica e literalmente falando.

  1. A Exposição das Escrituras não é suficiente. Já faz tempo que se ouve dizer que alguns recursos tem maior alcance que a Palavra exposta pela pregação. Dizia-se no fim do século passado que a música podia chegar a lugares onde a pregação não chegaria. Evidentemente a música tornou-se insuficiente, pois hoje acrescenta-se outras manifestações artísticas, tais como danças e encenações. Em suma, não se confia plenamente no método bíblico de proclamação do evangelho, aquele usando pelos profetas, Jesus e seus discípulos. Na melhor das hipóteses a exposição das Escrituras precisa ser acrescida de recursos que se comuniquem mais com os olhos do que com os ouvidos, isso, quando a pregação não é totalmente substituída.
  2. Há confusão entre dons e talentos. Muitas pessoas querem de alguma forma servir ao Reino, mas não buscam descobrir os dons bíblicos para tanto. No afã de serem relevantes, imaginam que teatro, dança e música são dons que servem a proclamação da Palavra, e que assim podem dividir espaço com o púlpito no culto público. Talentos não são transformados em dons espirituais pelo simples uso no contexto da igreja. Podemos dar o exemplo de uma pessoa que cozinha bem, e que pode servir aos irmãos em um acampamento ou jantar, mas que nem por isso faz com que a boa culinária seja um dom espiritual. Para um bom entendimento sobre esse tema, sugiro a leitura do artigo do pastor David Merkh, nesse link aqui.
  3. A reverência no culto tem sido abandonada. Nos movimentos neopentecostais criou-se a "adoração extravagante" onde se expressa a insatisfação com o culto restrito a Palavra, sacramentos, cânticos e orações. É triste que algumas igrejas históricas se deixem contaminar por esse impulso de "adorar a Deus" como lhes parece melhor. O Princípio Regulador do culto tem sido esquecido, e para muitos é um ensino completamente estranho à vida da igreja. No entendimento destes, não é Deus pela sua Palavra que institui a maneira como deve ser adorado, mas o "adorador", que acha que qualquer coisa "sincera" que lhe brote ao coração serve como culto. Mesmo sem usar imagens de escultura, quebram o segundo mandamento (Êxodo 20.4). 
Uma vez que se extrapola a mensagem bíblica para além da exposição da Palavra, e cada um promove seu próprio talento a dom, para servir segundo seu bel prazer, o culto torna-se um espetáculo (as vezes, literalmente falando). Ainda que a história de Jesus esteja sendo contada, textos encenados e músicas entoadas em um teatro ou cantata não podem substituir a Pregação da Palavra. Que toda criação é o teatro da glória de Deus, isso é fato. Mas, a dramatização do evangelho instituída no culto se dá pela proeminência da Palavra Encarnada, exposta nas Escrituras, e Proclamada do Púlpito, pelo pregador que nada mais é que o instrumento designado por Deus para tanto.
Toda honra, glória, louvor e poder neste drama, pertencem ao Senhor e Salvador de nossas almas. Não cabe aos servos se apossarem de um ato sequer deste drama, mas apenas servi-lo em gratidão e obediência. No culto, em oração, somos instados ao arrependimento e a confissão dos nossos pecados. Somos também convidados para louvar a Deus por toda sua Providência em Cristo Jesus. Os sacramentos são sinais externos da graça de Deus depositada na vida dos crentes, instituídos por Jesus, que, em outras palavras, são meios de graça que edificam a Igreja. Todos estes atos são permeados pela Palavra, porém, é justamente pela sua Exposição nas Escrituras que Deus nos fala com graça e verdade a respeito de seu Filho, desde sua encarnação, vida, morte e ressurreição. E nele que podemos ver atentamente a glória do Unigênito do Pai. A centralidade da Palavra no culto é a manifestação da glória do Filho de Deus, e sua habitação em definitivo conosco. As Escrituras é que testificam a seu respeito (João 5.39), e a pregação é o instrumento escolhido por Deus para sua exposição (2 Timóteo 4.2). Não temos autorização nem razão para substituirmos ou acrescentarmos ao púlpito nenhum outro recurso. Aqueles que o fazem, em maior ou menor escala, estão se rendendo ao antropocentrismo vigentes em muitas igrejas que já esqueceram a autoridade bíblica em sua vida e no culto público. Sejamos encontrados fiéis despenseiros tanto no conteúdo como na forma de anunciarmos a Jesus em tudo, desde o seu nascimento, vida, morte e ressurreição.

segunda-feira, 16 de novembro de 2015

Sobre Guerras e Rumores de Guerras

E, certamente, ouvireis falar de guerras e rumores de guerras; vede, não vos assusteis, porque é necessário assim acontecer, mas ainda não é o fim. Mateus 24.6


Que poder existe no mundo maior que o das guerras? Elas ceifam milhares de vidas, sejam de soldados ou de civis. Abalam a economia, transformam cenários urbanos em ruínas. Ninguém fica indiferente às guerras.
Guerras entre os povos sempre existiram. Para quem está longe do núcleo de conflito é muito difícil entender porque coisas aparentemente tão simples desencadeiam em tamanha destruição. Só pensamos assim porque nos esquecemos do quão corrompido é o nosso coração. Se sozinhos somos capazes de atrocidades pelo que julgamos justo aos nossos olhos, que dizer de um exército. São coisas pequenas, medíocres, dos seres humanos que trazem grande destruição.
Havia paz quando Jesus falou sobre guerras e rumores de guerras. Na Palestina daqueles dias Roma dominava sobre o mundo civilizado, e, pelo preço dos impostos, os judeus viviam pacificamente. Mas a Pax Romana podia ser descrita como na música contemporânea: "paz sem voz não é paz, é medo". Jesus anunciou que daqueles dias em diante, nos Últimos Dias, haveriam guerras e rumores de guerras, e assim se cumpriu.
O domínio romano ruiria em poucos séculos, mas não apenas de César, mas de todos impérios da Terra, conforme Daniel interpretou no sonho de Nabucodonosor (Daniel 2.44, 45). Uma vez que o Reino dos céus se estabelece sobre a Terra, e seu evangelho é anunciado, as guerras são inevitáveis, e propositais. As trevas odeiam a luz, a terra não quer sucumbir aos céus. Mas a luz dissipa as trevas, e a terra é subjugada pelos céus. Ao longo de séculos o mundo tem sido subjugado pelo reino de Cristo, as evidências disso estão não própria reconfiguração sofrida entre os povos. O Cristianismo não só derrubou Roma com auxílio da avidez dos bárbaros por se tornarem "romanos", derrubou as matrizes de um mundo dominado por homens que acreditavam serem deuses. O Cristianismo proclama o Deus-Homem como supremo Senhor de todas as coisas, e chama os homens para crerem nele tornando-se irmãos. O Cristianismo exalta o Senhor do Universo que se fez servo, e chama aqueles que se acham senhores de qualquer coisa para servirem. Uma sociedade mais justa e igualitária em comparação aos séculos anteriores foi edificada sobre esse alicerce. Mas existem aqueles que ainda querem insurgir contra isso.
Que poder há no mundo maior que o das guerras? O poder do evangelho do Senhor Jesus Cristo. O poder de dar a Vida ao invés de tirá-la. O poder que não sucumbe às essas guerras, mas que as tornam necessárias como apontamento de que a verdadeira paz não se encontra sob o governo dos homens, mas no Reino do Filho de Deus. Mais poderoso do aqueles que dominam com terror sobre os demais homens, Jesus domina com amor sobre o coração daqueles que reconhecem seu senhorio. Ele não apenas venceu a morte exterior, mas deu vida em abundância quando nos resgatou do poder do pecado. Esse é o poder triunfou para sempre, e eternamente, amém.

terça-feira, 9 de junho de 2015

Sobre a Parada Gay, Iconoclastia e a Desfiguração da Imagem de Deus

Antíoco Epifânio 215- 162 a.C 
Vejo multiplicar-se na rede as fotos da Parada Gay desse último fim de semana em São Paulo, com imagens de um transexual caracterizado como Jesus crucificado. Com essa e outras imagens iconoclastas, observo também as manifestações de indignação de muitas pessoas. Percebo o quanto isso ofendeu a muitos, tanto evangélicos como outros seguimentos religiosos. Apesar do repúdio a essas práticas agressivas a fé, questiono a natureza da indignação a essas coisas.
Quero que fique claro de início que não defendo nenhuma anistia aos crimes de intolerância religiosa. Creio que os que praticaram tais ultrajes devem enfrentar os rigores da lei sobre seus feitos. Existe uma evidente incoerência entre o que exigem e o que praticam. Falam em respeito e tolerância às pessoas e suas práticas, mas não demonstram nenhum respeito ou tolerância a fé das outras pessoas. O que fazem em eventos como os da Parada Gay, e em outras ocasiões semelhantes, não somente é crime, como também de uma estupidez sem tamanho.
O que questiono mais incisivamente aqui é o sentimento que verdadeiros cristãos devem ter sobre tais manifestações dos movimentos homossexuais. Como devemos encarar tais ofensas e provocações de grupos sexualmente invertidos?
Parto de uma primícia simples: Nada que um homossexual faça em suas performances iconoclastas, ou seja, com o intuito de ofender a religiosidade cristã, é mais grave que o próprio homossexualismo em si. Homens ou mulheres homossexuais que se amarram em uma cruz, que se caracterizam aparentemente como Jesus, ou como santos católicos, não ofendem mais a Deus do que quando entregam seus corpos a desonra (Romanos 1. 26,27). Ao ofenderem a religiosidade alheia, o fazem somente aos sentimentos que alguns nutrem sobre ícones de sua fé. O que quero dizer com isso?
Não sou católico, e por isso não tenho nenhuma relação com qualquer imagem que se possa confeccionar de algum de seus santos. Com isso, tenho que ressaltar o que já disse: não endosso nenhum tipo de crime de intolerância e desrespeito a religiosidade de outrem. Como disse, isso merece o rigor da lei.
Mas o que dizer do uso da "imagem" de Jesus e da cruz? Cabe aqui algum tipo de indignação pessoalNão seriam símbolos da fé cristã vilipendiados? Não.
Um homem com barba e cabelo cumprido representa tanto Jesus quanto um punhado de algodão pode representar uma nuvem. Em outras palavras, você imaginar alguma semelhança entre ambos, mas simplesmente isso não faz com um represente o outro. Concebemos que Jesus tinha essa aparência por uma sacramentação histórica, mas isso não faz dessa caracterização a imagem de Cristo. A representação de Cristo que temos, e isso como ordenança dele próprio, é no pão que simboliza seu corpo, e no cálice, que aponta para seu sangue. Não posso por isso me sentir ofendido em lugar de Deus com alguém que se vista assim, ainda que sua óbvia intenção seja a de ultrajar Jesus Cristo.
E quanto a cruz? Afinal ela é parte vital da mensagem cristã. Sim, o madeiro é o lugar da expiação dos nosso pecados, é a prova do amor de Deus para com o seu povo. Mas não podemos tomar o objeto cruz como algo sacramentado em nós. O "escândalo da cruz" é outro (1 Coríntios 1. 18,23). Uma cruz ou um crucifixo em si não comunicam o evangelho. E, sendo assim, não imagino que Deus se ofenda com seu uso indevido.
A história nos conta de Antíoco Epifânio  em 167 a.C profanou o Templo em Jerusalém, sacrificando animais imundos e introduzindo ali imagens de Zeus. Isso evidentemente era uma afronta ao Deus de Israel, mas ainda assim, era não só previsto (Daniel 11.31; 12.11), como também proposto para apontamento dos Últimos Dias (Mateus 24.15). Se Deus não entrou em "crise" com o sacrilégio praticado em seu Templo, que foi estabelecido por ele mesmo em toda sua estrutura, será que Ele estaria indignado pelas performances porcas praticadas por homossexuais em seus desfiles para a morte? Imagino que não.
Creio que a justa indignação do Criador se volta contra a homossexualidade em si, sendo isso afirmado nas Escrituras (Romanos 1.18, 28-32; 1 Coríntios 6.10; Apocalipse 22.15). Essas pessoas estão de fato desfigurando a semelhança de Deus, uma vez que foram criados macho e fêmea, à imagem do Criador foram criados assim (Gênesis 1.27). A homossexualidade é uma afronta nevrálgica a ordem da criação, e, por isso, passível do juízo de Deus. Penso assim que não podemos nos indignar mais com caracterizações ultrajantes, do que com as ofensas diretas a Deus em sua imagem e semelhança. Parafraseando o ditado repulsivo: O que é um pingo d'água para quem já está encharcado?
Um outro ultraje maior, e passível de repulsa daqueles que amam a Deus é a torção das Escrituras. Sejam aqueles que justificam seu pecado pela Palavra, tornando o mal em bem, as trevas em luz, e o amargo em doce, bem como aqueles que se autopromovem como semi-deuses (Isaías 5.20). Usar Bíblia distorcidamente é uma afronta ao Senhor, é a quebra do terceiro mandamento "Não tomarás o Nome do Senhor teu Deus em vão" (Êxodo 20.7). Sinto uma grande ojeriza por esses que o fazem assim, sejam os militantes gays ditos evangélicos, sejam os pastores mercadores da Palavra. Para mim são inimigos de fato (Salmo 139.22). Vejo estes como os judeus descritos em Romanos 2.24, sendo eles a causa de blasfêmia contra o Nome de Deus.
Devemos assim ter maturidade a luz da Palavra para tratar com movimentos invertidos como esses. Devemos ter o foco no que realmente tange a Deus e sua Palavra. O que simplesmente ofende aos homens, pode até ser tratado na esfera jurídica, mas não pode causar tanta indignação quanto ao que afronta o Criador. 
A Palavra nos conclama a vencer o mal com o bem (Romanos 12.21). A arma poderosa que temos contra toda perversão, inclusive a sexual, é a pregação do evangelho, anunciando o amor de Deus em Cristo, o chamado ao arrependimento, e a anunciação do justo juízo sobre todo pecado. Nosso zelo deve estar sobre a Palavra e o que ela nos diz a respeito de Deus e do ser humano. E é dela que também devemos depender na guerra contra esse mundo que jaz no Maligno (1 João 5.19).   

quarta-feira, 18 de março de 2015

Preparando-se para o pior trocando fraldas.


Se tem uma coisa que "odeio com ódio consumado" é trocar fraldas sujas de cocô. Faço exclusivamente por causa do amor que tenho pelos meus filhos. Se alguém puder me substituir nessa árdua tarefa, por vezes não rejeito a ajuda. Mas, por outro lado, penso que existe algo pessoalmente construtivo nesse "trabalho sujo", além, é claro, da higiene necessária. Tenho aprendido muita coisa desde o nascimento do Benício observando seu crescimento e também desempenhando as responsabilidades que me concernem como pai. Com o Leon não é diferente. Hoje mesmo, trocando sua fralda, me peguei avaliando a importância que isso tem para o nosso futuro relacionamento.
Graças a Deus que as crianças normalmente crescem e começam a desempenhar suas responsabilidades pessoais sozinhas. Ir ao vazo sanitário, tomar banho, e também comer, já não são tarefas que requerem o acompanhamento dos pais. Existe a exceção daquelas crianças que tem alguma deficiência, e que por isso precisam de cuidados por toda a vida. Nisso também é provado o amor de seus pais, pois só quem ama vê a "viabilidade" do que para outros parece inviável. Mas aqui quero me ater a regra pela qual o ser humano cresce e torna-se capaz de por si mesmo cuidar do próprio corpo.
É uma alegria e uma alívio constatar que as crianças seguem o curso natural da vida, e aprendem a se virar. Mas seria essa independência absoluta? Estaríamos livres das "fraldas de cocô" que odiamos para sempre? A verdade é que sempre tem alguma "fralda suja" para ser trocada ao longo da vida. Algo que não gostamos de fazer, mas que o fazemos pelo simples fato de amar nossos filhos. É como diz o ditado "por amor ao santo se beija o andor".
Em cada fase da vida, da infância a idade adulta, até onde formos capazes de acompanharmos com alguma disposição física e mental, testemunharemos atitudes de nossos filhos que nos forçarão a intervir com o mesmo cuidado e amor que dedicamos nos seus primeiros anos ao trocarmos suas fraldas. Todavia, diferente do tipo de sujeira do princípio, as circunstâncias que surgem ao longo da vida, que não são de natureza fisiológica, mas condutas, ideias e comportamentos que não se desfazem de maneira tão simples. Isso tem implicações maiores em seu tratamento.
A primeira implicação sobre isso é que essas questões, em sua maioria de natureza moral, não se solucionam de imediato. Fralda suja e cocô são eliminados facilmente no lixo e com água. Mas, uma vez crescidos os filhos, certamente tomarão algumas decisões erradas, ou pecaminosas com quais precisamos lidar com mais tempo. Faço diferença aqui entre o que chamo de decisões erradas e o que é pecaminoso. O primeiro são escolhas que contrariam a experiência pessoal dos pais, e que entendemo que não são as melhores, mas que ainda assim não são em si mesmas contrárias aos absolutos da Palavra de Deus. O pecado por sua vez não é relativo ao que achamos melhor, mas é a transgressão da Lei, algo a que devemos nos opor veementemente, sem complacência.
Também, devemos considerar que assim como é provável que tais contrariedades não são eliminadas com facilidade, podem não ser eliminadas nunca. Somos pais, não programadores. Ensinamos quando e o quanto é possível, mas isso não quer dizer que os filhos aprendem sempre. E se não aprendem, o que nos resta a fazer quando forem maiores, responsáveis por sua vida? Não vejo nesse espaço condições para responder isso, até porque não é essa minha proposta agora. Isso também não seria possível uma vez que não estamos tratando de nada específico.
Por fim, a dificuldade existe porque é um processo continuo, um treinamento sempre. Somos ensinados a amar nossos filhos desempenhado funções que não gostamos. O amor que temos não é algo pronto, mas sendo provado ao longo da vida, cresce a medida que somos chamados a enxergar o outro muito além daquilo que nos agrada. Lidar com aqueles que nos ferem, ou ferem princípios que defendemos, é relativamente fácil quando se trata de pessoas distantes. Mas quando aqueles que amamos, que comem do nosso pão "levantam contra nós o calcanhar", tudo é mais difícil (Salmo 41.9). Se amamos de fato, precisamos aprender a lidar com as circunstâncias que nos contrariam, sabendo que não se faz como quem joga uma fralda fora. Mas inicialmente treinamos com essas fraldas, com noites em branco. Tudo que hoje nos contraria por questões de ordem natural, amanhã servirá para nos fazer lembrar que o amor não é um sentimento, uma sensação sempre boa, mas um verbo a ser conjugado, e que nem sempre nos faz sentir bem.      

quinta-feira, 19 de fevereiro de 2015

Ora et labora - Orar e denunciar o mal feito pelo governo


Tenho visto algumas pessoas conclamando os irmãos a orarem pela presidente da República, Dilma Rousseff  ao invés de criticarem. Fazem bem estimulando outros a orar, mas creio que a censura a crítica deve ser ponderada. Necessariamente uma coisa não anula a outra. E, ainda, dependendo das circunstâncias, uma coisa leva a outra. O lema beneditino evidencia isso, que a oração não anula o trabalho. A Igreja deve orar, mas também deve laborar.
São as Escrituras que nos conclamam a respeitar as autoridades (Romanos 13.1-6), e também orar por elas (1 Timóteo 2.1, 2). Todo cristão deve se submeter a esses mandamentos, seja qual for a autoridade constituída sobre o povo. Em outras palavras, devemos orar e  nos submetermos a governantes justos ou injustos. Isso é evidente pelo próprio contexto histórico de quando Paulo escreve essas palavras: eram os dias do Imperador Nero. Sem contar que ele não especifica que um governador bom é o único pelo qual se deve orar ou submeter-se. Sempre houve injustiça e corrupção no governo, isso antes de Paulo e depois, e ainda assim ele não faz ressalva a quem se submeter ou por quem orar. A verdade é que devemos orar pelas autoridades, e nos sujeitarmos a elas, mas não a injustiça. Enquanto esses governantes não nos ordenam nada contrário a Palavra de Deus, devemos prestar-lhes obediência.
Mas seria somente esse o nosso papel enquanto cristãos? Orar nos impede de denunciar o pecado? A Igreja deve servir também como consciência do Estado, chamando-o ao arrependimento de seus pecados.
Desde o Antigo Testamento os profetas desempenhavam esse papel. Mesmo o último dos profetas da Velha Aliança, João Batista, não se furtou de chamar ao arrependimento o rei Herodes, denunciando seus pecados. A obra de anunciar o Cristo não o impediu de denunciar pecados, tantos das autoridades como do povo.
Os evangelista Marcos e Mateus fazem uma observação indiretamente crítica às autoridades da época, dizendo que o povo era como "ovelhas que não têm pastor" (Mateus 9.36; Marcos 6.34). Esta expressão emprestada do A.T aponta para a falta de liderança, ou, ainda pior, líderes corruptos.
Os apóstolos Pedro e João, diante das autoridades do povo, não se deixaram de denunciar o pecado de assassinarem a Jesus, como o fizeram com o povo (Atos 2.23; 4.10).
Apesar de me opor politicamente ao atual governo do meu país, não me furto de orar pelos governantes, e isso inclui a presidente da república. Ensino isso a minha igreja todas as quintas feiras na reunião de oração. Mas não posso fechar os olhos para os desmandos, os crimes e toda ideologia nefasta que tem vigorado nos últimos anos. A questão é maior que um partido político, trata-se de uma agende para a desconstrução de valores. Trata-se da inversão do certo pelo errado.
Todas as oportunidades que tive de conversar com políticos, falei da necessidade de que entreguem suas vidas a Deus para fazerem um governo justo. Falei que precisavam confiar em Deus, pois não foram homens que os colocaram lá. É a Ele que no fim prestarão contas.
Sei que muitos crentes do estilo "Jesus te ama" não tem coragem de denunciar o pecado, e se escondem por trás do "vamos orar e não criticar". Sei também que muitos criticam e não oram, e isso é igualmente errado. Mas creio que orar e denunciar pecados são igualmente funções da Igreja para com o Estado. Orar sem se posicionar contra o errado é como endossar o pecado, ou até mesmo negar a responsabilidade daqueles que o têm praticado.
Orem pela presidente do país e demais autoridades, mas não fechem os olhos para o que está errado. Orem por eles não só para que governem bem, mas para que se arrependam de seus pecados. Orem pelo povo oprimido socialmente, mas igualmente corrupto, para que seja libertos de seus grilhões, principalmente os da morte, a saber, a iniquidade.