quarta-feira, 18 de março de 2015

Preparando-se para o pior trocando fraldas.


Se tem uma coisa que "odeio com ódio consumado" é trocar fraldas sujas de cocô. Faço exclusivamente por causa do amor que tenho pelos meus filhos. Se alguém puder me substituir nessa árdua tarefa, por vezes não rejeito a ajuda. Mas, por outro lado, penso que existe algo pessoalmente construtivo nesse "trabalho sujo", além, é claro, da higiene necessária. Tenho aprendido muita coisa desde o nascimento do Benício observando seu crescimento e também desempenhando as responsabilidades que me concernem como pai. Com o Leon não é diferente. Hoje mesmo, trocando sua fralda, me peguei avaliando a importância que isso tem para o nosso futuro relacionamento.
Graças a Deus que as crianças normalmente crescem e começam a desempenhar suas responsabilidades pessoais sozinhas. Ir ao vazo sanitário, tomar banho, e também comer, já não são tarefas que requerem o acompanhamento dos pais. Existe a exceção daquelas crianças que tem alguma deficiência, e que por isso precisam de cuidados por toda a vida. Nisso também é provado o amor de seus pais, pois só quem ama vê a "viabilidade" do que para outros parece inviável. Mas aqui quero me ater a regra pela qual o ser humano cresce e torna-se capaz de por si mesmo cuidar do próprio corpo.
É uma alegria e uma alívio constatar que as crianças seguem o curso natural da vida, e aprendem a se virar. Mas seria essa independência absoluta? Estaríamos livres das "fraldas de cocô" que odiamos para sempre? A verdade é que sempre tem alguma "fralda suja" para ser trocada ao longo da vida. Algo que não gostamos de fazer, mas que o fazemos pelo simples fato de amar nossos filhos. É como diz o ditado "por amor ao santo se beija o andor".
Em cada fase da vida, da infância a idade adulta, até onde formos capazes de acompanharmos com alguma disposição física e mental, testemunharemos atitudes de nossos filhos que nos forçarão a intervir com o mesmo cuidado e amor que dedicamos nos seus primeiros anos ao trocarmos suas fraldas. Todavia, diferente do tipo de sujeira do princípio, as circunstâncias que surgem ao longo da vida, que não são de natureza fisiológica, mas condutas, ideias e comportamentos que não se desfazem de maneira tão simples. Isso tem implicações maiores em seu tratamento.
A primeira implicação sobre isso é que essas questões, em sua maioria de natureza moral, não se solucionam de imediato. Fralda suja e cocô são eliminados facilmente no lixo e com água. Mas, uma vez crescidos os filhos, certamente tomarão algumas decisões erradas, ou pecaminosas com quais precisamos lidar com mais tempo. Faço diferença aqui entre o que chamo de decisões erradas e o que é pecaminoso. O primeiro são escolhas que contrariam a experiência pessoal dos pais, e que entendemo que não são as melhores, mas que ainda assim não são em si mesmas contrárias aos absolutos da Palavra de Deus. O pecado por sua vez não é relativo ao que achamos melhor, mas é a transgressão da Lei, algo a que devemos nos opor veementemente, sem complacência.
Também, devemos considerar que assim como é provável que tais contrariedades não são eliminadas com facilidade, podem não ser eliminadas nunca. Somos pais, não programadores. Ensinamos quando e o quanto é possível, mas isso não quer dizer que os filhos aprendem sempre. E se não aprendem, o que nos resta a fazer quando forem maiores, responsáveis por sua vida? Não vejo nesse espaço condições para responder isso, até porque não é essa minha proposta agora. Isso também não seria possível uma vez que não estamos tratando de nada específico.
Por fim, a dificuldade existe porque é um processo continuo, um treinamento sempre. Somos ensinados a amar nossos filhos desempenhado funções que não gostamos. O amor que temos não é algo pronto, mas sendo provado ao longo da vida, cresce a medida que somos chamados a enxergar o outro muito além daquilo que nos agrada. Lidar com aqueles que nos ferem, ou ferem princípios que defendemos, é relativamente fácil quando se trata de pessoas distantes. Mas quando aqueles que amamos, que comem do nosso pão "levantam contra nós o calcanhar", tudo é mais difícil (Salmo 41.9). Se amamos de fato, precisamos aprender a lidar com as circunstâncias que nos contrariam, sabendo que não se faz como quem joga uma fralda fora. Mas inicialmente treinamos com essas fraldas, com noites em branco. Tudo que hoje nos contraria por questões de ordem natural, amanhã servirá para nos fazer lembrar que o amor não é um sentimento, uma sensação sempre boa, mas um verbo a ser conjugado, e que nem sempre nos faz sentir bem.