terça-feira, 7 de agosto de 2018

Qual é o teu Nome?

Perguntou-lhe, pois: Como te chamas? Ele respondeu: Jacó.
Gênesis 32.27

Jacó, que significa suplantador, trapaceiro, viveu sua vida até aquele dia à sombra do seu nome. De fato, esse nome dizia muito acertadamente quem ele era. Lutando contra o Anjo, sem entendermos bem por que razão exatamente, o patriarca pelejou a noite toda. É óbvio que o Anjo podia tê-lo vencido rapidamente, mas deixou a briga se arrastar até quando quis. Para por fim a disputa, simplesmente golpeou sua coxa tornando Jacó manco. E, como tal, em condições humilhantes, o patriarca "deteve" seu oponente para que lhe abençoasse. Esse é o tipo de história que parece estranha, com pontos cegos, mas que a luz das Escrituras pode ser esclarecida.
O Anjo proporcionou ao nosso anti-herói um déjà-vu. Ele fez uma pergunta muito semelhante a que anos atrás Jacó ouviu quando pelejava pela benção com seu pai, enganando-o, e ao mesmo tempo passando a perna em seu irmão Esaú: "Como te chamas? Quem és tu, meu filho?" Na primeira vez, diante dos olhos cegos de seu pai, sua resposta foi "Sou Esaú, teu primogênito". Mas agora, diante daquele que tudo vê, sua resposta sincera e simples foi "Jacó". Era praticamente uma confissão.
Conta a anedota que o menino mal-criado respondeu ao padre: Eu não me chamo, os outros é que me chamam. O nome Jacó, dado ao segundo filho de Isaque já previa quem ele seria, o que de fato confirmamos pela sua história. Mas o mesmo pode ser dito do nome dado pelo Anjo: Israel significa "Deus Prevalece". E pela própria explicação dada em seguida, fica claro que "como príncipe pelejou com Deus e com os homens e prevaleceu". Tratava-se agora de um êxito honroso, não mais de artimanhas ou traições. O velho Jacó tinha tido sucesso como Israel, como "Deus Prevalece".
Devemos considerar que o propósito de Deus prevalecia sobre o patriarca. Mesmo antes de nascer, quando já lutava no ventre de sua mãe com seu irmão, o SENHOR já havia anunciado que o menor prevaleceria sobre o maior (Gênesis 25.23). O segundo tornaria-se o primeiro (príncipe); o menor, o caseiro e mais frágil, tornaria-se aquele que lutaria com o próprio Deus. Jacó sempre foi Israel.
Porém, outro aspecto precisa ser considerado nessa história ainda um pouco nebulosa. Israel não seria apenas o nome do patriarca, mas da nação escolhida por Deus. E nesse sentido, a nação também faria jus ao primeiro nome de seu pai. Israel era Jacó, pois desde os seus doze filhos observamos sucessivas ocasiões de enganos e traições. Basta a leitura dos primeiros versículos da benção de Israel aos seus filhos para se ter ideia de episódios assim na vida dos seus três primeiros filhos (Gênesis 49.1-7). Também toda história de Israel desde o Êxodo até o Exílio faz com que percebamos que as características de Jacó se aplicavam a sua descendência. A traição no deserto veio através da idolatria, e se estendeu à terra prometida nos dias dos Juízes. Mentiras, adultério e violência também adentraram aos palácios dos reis de Israel, e se viu junto aos sacerdotes e do povo. As denúncias dos profetas ao longo da narrativa do Antigo Testamento sempre apontaram para o quanto esses filhos conservaram viva a fama do nome Jacó em sua trajetória.
Indo além deste período, mesmo no Novo Testamento, observamos que a Igreja, o Israel do Senhor, também por vezes se porta como seus pais na Antiga Aliança. Relatos em Atos, como no caso de Ananias e Safira, casos vergonhosos descritos nas epístolas aos Coríntios, nos dão a sensação de que o tempo não passou, e que como disse Belchior em sua célebre canção "ainda somos os mesmos/ e vivemos como nossos pais". Em muitos aspectos como a nação de Israel, a Igreja nesses últimos dias é sua extensão não somente como herdeira da promessa, mas ainda como representante desse nome paradoxo nascido do ventre de Rebeca. Somos um povo de segunda, fracos, desprezíveis (1 Coríntios 1.26-28), mas que também recebeu o nome de um Príncipe. Apesar de correspondermos a alcunha de Jacó, desde a eternidade já havia sido preparado para nós o nome de Israel.
Israel não era apenas o segundo nome que o Patriarca receberia, ou o nome da Nação que dele descendia. Israel era o nome do Príncipe que lutou com Deus e o os homens e prevaleceu. Era o nome do Filho escolhido de Deus "Quando Israel era menino, eu o amei; e do Egito chamei o meu filho" (Mateus 2.15; Oseias 11.1). Jesus, que significa "Ele salvará o seu povo dos seus pecados", é o Nome acima de todo nome. Na cruz Jesus pelejou por nós com Deus, e diferente de Jacó, que apenas teve a sua coxa tocada, o Cristo não foi poupado. Mas apesar do que podia parecer fraqueza ou derrota, sua morte foi, na verdade, sua vitória. Deus Prevalece é o seu Nome, e é nesse nome que somos contados como quem também prevalece.
Quando perguntam pelo meu nome, posso responder com aquele que recebi de meus pais. Junto com ele recebi uma herança maldita desde Adão. Por trás do meu nome escondem-se muitas coisas das quais me envergonho, e que me lembram o nome de Jacó. Lutei com minhas forças para mudar de nome, mas somente pelo Nome de Israel, o Filho a quem Deus ama, e que por mim se entregou na cruz, é que pude receber um novo nome: Cristão. Como Jacó, ainda manco como efeito da luta que travei ao longo de minha vida. Como Jacó, pelo restante dos meus dias serei ainda lembrado pelos pecados que cometi e cometo. Mas como Israel, prevaleci com um nome que não me foi dado quando nasci, que não era meu, mas que estava preparado para mim desde antes da fundação do mundo, e no qual foi abençoado.