quarta-feira, 23 de outubro de 2013

A sedução enganosa do medo


Recentemente assisti o filme "Invocação do Mal". Não consigo assistir um filme sem me ater às questões teológicas implícitas. Apesar de bastante aterrorizante, e baseado em fatos, este filme não esta entre os mais assustadores que assisti. O que me fez refletir sobre o filme, especialmente nas cenas de manifestações sobrenaturais, é como Satanás usa o medo como uma poderosa arma de sedução.
Neste filme, como em praticamente todos do gênero, manifestações sobrenaturais amedrontam as pessoas dentro e fora da tela. Em frente ao projetor, os espectadores tem a sensação de participar da história, mas apenas virtualmente. No mundo real, um caso de possessão demoníaca não seria acompanhado tão de perto por pessoas sentadas em uma poltrona confortável. O medo que sentem em segurança acaba convertido em diversão. Esse prazer quase masoquista corresponde a satisfação da curiosidade pelo sobrenatural, ainda que acompanhado de incredulidade por muitos.
O sobrenatural tem o poder de seduzir por fugir do é cotidiano. Desde os assombros mais suaves, aos mais violentos, a ideia que se tem é de que os demônios são poderosos, e podem desestruturar da vida de qualquer um. A questão é: Satanás tem todo esse poder de fato? Não sou cético quanto ao que Satanás pode fazer, quanto à manifestações sobrenaturais, e inclusive possessão demoníaca de pessoas não nascidas de novo. Mas a questão a que me refiro é se por trás de tudo que é demonstrado sobrenaturalmente se encontra um ser tão poderoso quanto aparenta.
Satanás mente até quando diz a verdade, e isso é visível em filmes de terror como esse. Muitas pessoas rejeitam a possibilidade de existência de seres espirituais como Satanás e seus demônios. Mas filmes como "Invocação do Mal", ou "O Exorcismo de Emily Rose", são baseados em relatos verídicos de acontecimentos que podem não ter explicação para céticos, mas que ainda assim não são fictícios. Assim, filmes como esses reafirmam a existência de seres sobrenaturais os quais denominamos Satanás e demônios. Mas ao mesmo tempo, conferem a essas entidades um poder quase invencível. As manifestações extraordinárias, ainda que aconteçam, fazem com que as pessoas pensem que se tratam de seres mais poderosos até mesmo que Deus, o qual, quando muito, não passa de mais um espectador nessas histórias. Assim, Satanás é apresentado acertadamente como um ser real e poderoso, mas falsamente como mais poderoso que o próprio Deus.
Esse primeiro engodo é seguido do segundo. Como Deus é completamente passivo nessas histórias, cabe ao homem combater com suas forças os poderes do mal. Satanás sempre é vencido pelo bem que supostamente existe nas pessoas, tal como o amor pela família, ou o de algum sacrifício próprio. Mesmo um ritual de exorcismo nada mais é que uma queda de braço entre o exorcista e o demônio. A ideia deísta de que Deus se ausentou do cenário do mundo permeia o pensamento destas obras cinematográficas. Tudo se resume a luta entre as forças sobrenaturais demoníacas e os sentimentos puros dos homens. No fim, os homens de bem vencem as forças do mal. Certamente essa mensagem também é agradável à platéia.
Mas a "verdadeira verdade" é muito diferente do que se apresenta em cena como essas. Deus realizou na história relatada nas Escrituras sinais muito mais extraordinários do que qualquer demônio de filme poderia encenar. Mas ainda assim, a manifestação mais poderosa já realizada se deu em uma circunstância considerada pelo mundo como sinal de fraqueza: A morte de Jesus na cruz. A Palavra diz que na cruz Jesus rasgou nosso escrito de dívida, e despojou principados e potestades expondo-os a vergonha (Colossenses 2.14,15). O que se quer dizer é que na cruz o Senhor triunfou não somente sobre Satanás e suas hostes, mas sobre o maior terror que pode abalar todo homem, a condenação na morte. Jesus venceu na cruz o terror do juízo eterna que o próprio Deus traria sobre os pecadores. Assim, o verdadeiro poder se encontra não em manifestações sobrenaturais, que ainda que possíveis, não devem nos causar temor. O verdadeiro poder se encontra em Jesus Cristo, que morreu, mas ressuscitou, e que tem as chaves da morte e do inferno em suas mãos (Apocalipse 1.18). É em seu trinfo que devemos crer e confiar, para que nenhuma manifestação satânica tire de nós a paz e seduza pelo medo.  

terça-feira, 22 de outubro de 2013

Entre ser livre e escravo, e ser um escravo livre


É possível que uma pessoa livre seja escrava? Ou ainda, que um escravo seja livre? Apesar da antinomia, creio que a resposta é sim para ambas as questões. Assistindo ontem ao filme Serra Pelada pensei muito sobre tudo isso. Como uma pessoa livre pode se fazer escrava, e um escravo ser encontrado livre. Como de costume, não quero ser spoiler (alguém que conta o fim de um filme ou livro, um estraga prazer), e com isso me detenho apenas a sinopse do filme.
A trama é simples, dois amigos de infância saem de São Paulo no inicio da década de 80 e seguem para Serra Pelada. Um professor sem emprego, com a esposa grávida, e um fortão sem profissão. Ambos buscam o sonho dourado de ficarem ricos. Ambos se perdem nos barrancos de terra e ouro do maior garimpo a céu aberto que o mundo já conheceu.
O que me chamou atenção é como algo que deveria trazer liberdade pode fazer de alguém um escravo. Em tese, o ouro deveria tornar suas vidas melhores, mas não é o que aconteceu. Todo sonho cultivado vai por água abaixo quando se torna um fim em si mesmo. Como prometi, não falo mais nada sobre o filme a fim de não aborrecer ninguém. Vale a pena assistir não apenas pela obra em si, mas também porque é o retrato da terrível realidade, não só daqueles dias, mas de milhares de zonas de garimpo espalhadas no Brasil e no mundo.
Partindo para a alegorização desta obra (sim, podemos alegorizar um filme, mas não a Bíblia), vejo muitos barrancos de garimpos na vida das pessoas. Vejo gente que em busca de um sonho de tornar sua vida melhor, embrenhou-se em um grande pesadelo. Tornam-se escravos daquilo que supostamente lhes traria felicidade. Não vêem diante de si outra possibilidade que senão a de satisfazerem a si mesmos, ainda que isso lhes custe a própria vida. Como bem pontuou Reverendo Augustus Nicodemus sobre o texto de Romanos 1.18-32: o que buscam como prazer, Deus lhes concede como maldição.
Certa feita, falando de Jesus para uma prostituta, perguntei porque ela estava nessa vida. Ela respondeu que tinha sonhos de consumo; uma casa, carro, móveis. Disse-lhe que estava vendendo algo muito mais precioso para comprar coisas de tão pouco valor. Ou não é a vida mais que a comida, e o corpo mais que as roupas? (Mateus 6.25)
Mesmo pastores têm feito das igrejas verdadeiros barrancos de garimpo. Num desejo desenfreado de garantir-lhes a sobrevivência, escravizam outras pessoas e a si mesmos. Não lhes ocorre uma vida independente da igreja. Essa é uma frase tirada de seu contexto pode sugerir que estou dizendo que um pastor não tem direito ao salário, ou talvez que pode viver alheio ao rebanho. Nada disso! Quero dizer que a verdadeira dedicação ao rebanho do Senhor, é quando não fazemos da Igreja nossa tábua de salvação. É quando pastoreamos não por força, sórdida ganância ou por posse, mas por sujeição e submissão ao Senhor, nosso e da Igreja, na esperança de sua manifestação (1 Pedro 5.1-4).
Somente somos livres de fato quando por amor nos reconhecemos escravos de Cristo. Os escravos hebreus não podiam ser mantidos assim em Israel por mais de sete anos, a não ser que, por amor a seu senhor, deixassem sua orelha ser perfurada por uma sovela (Deuteronômio 15. 16,17). Pelo alto preço que Jesus pagou, é que uma pessoa é livre de fato, tendo sua orelha perfurada pelos pregos da cruz do Calvário. E se o próprio Filho de Deus, o Senhor do Universo, fez-se escravo quando veio a este mundo, quem sou eu para achar que posso me fazer livre?