quarta-feira, 15 de junho de 2016

Sobre a morte dos ímpios e a misericórdia de Deus


No atentado terrorista ao jornal satírico Charlie Hebdo, quando terroristas mulçumanos mataram doze pessoas, e feriram outras cinco, não cedi a tentação de enxergar naquilo algum tipo de juízo de Deus. O fato de publicarem charges que insultam indistintamente Cristianismo e Islamismo, não justifica, nem sequer em pensamento, aquele massacre. Não creio que a ira de loucos mulçumanos produziria a justiça de Deus, e nem vice-versa. Não creio que a ira de nenhum tipo de louco assim o faça.
Quando agora em uma casa noturna gay, um terrorista islâmico mata quarenta e nove pessoas, e fere quase o mesmo número, continuo sem ver uma relação direta do juízo de Deus sobre o pecado dessas pessoas. Ainda que alguns pensem que a iniquidade deles justifique sua execução, não é isso que a Bíblia nos ensina quanto ao caráter de Deus. Em Ezequiel 33.11, a Palavra é explícita quanto ao que preceitua o coração do SENHOR, de que Ele não tem prazer na morte do perverso, mas sim em que se converta do seu mau caminho. E, assim sendo, se Deus, o justo juiz de toda a terra, não tem prazer nessas mortes, como podemos nós, cristãos, termos algum tipo de satisfação em atrocidades cometidas em nome de uma suposta justiça divina? Não podemos partilhar desse sentimento sem incorrer em injustiça.
É verdade que as circunstâncias são complexas, mas até mesmo um ateu como Jean Rostand, evidentemente de uma perspectiva diferente, é capaz de visualizar esse quadro de forma lógica. Ele diz: Se alguém mata um homem, é um assassino. Se mata milhões de homens, é um conquistador. Se mata todos, é um Deus. Quero dizer com isso que não obstante os homens serem responsáveis por suas barbáries, Deus, o Soberano, é quem tem poder sobre a vida e a morte de toda humanidade. Na passagem do profeta Ezequiel, o povo de Israel ainda é advertido em forma de questionamento: Por que razão morrereis, ó casa de Israel? Deus os chama ao arrependimento, pois seu prazer está em que se convertam e vivam.
Balas não converterão os perversos. Ofensas não converterão ninguém. O descaso pela vida humana não trará arrependimento ao coração daqueles que desprezam o SENHOR. Nosso papel como atalaias é de testemunhas contra o pecado, chamando os pecadores ao arrependimento. Esse testemunho, firmado na pessoa e obra de Jesus Cristo, o Justo, conta também com a referência a nós, pecadores. Outrora mortos em nossos delitos e pecados, recebemos vida pelo grande amor com que Deus nos amou. Fomos chamados ao arrependimento, e pela graça operada em nossos corações, sendo contemplados com a fé nas promessas de perdão no nome de Jesus. Sim, nós também caminhávamos a passos largos para a condenação, como qualquer outro pecador. Nosso livramento se deu exclusivamente pela graça de Deus. Não é preciso ser o que se poderia chamar de “notório pecador” para merecer a morte (Romanos 6.23), basta ser pecador. E, como todos pecaram, todos foram destituídos da glória de Deus (Romanos 3.23).
Desta sorte, o mesmo Deus que não tem prazer na morte dos ímpios, é também aquele que executa sobre eles o seu juízo. Mas isso não se dá pela forma da morte em si, seja pela execução nas mãos de um criminoso, ou em circunstâncias trágicas. Em Lucas 13.1-5 o Senhor Jesus fala sobre a morte dos galileus pelas mãos de Pilatos, e também dos habitantes de Jerusalém sob a torre de Siloé. É explanado que, independente de como morreram aqueles homens, todos os demais, igualmente, se não se arrependerem, perecerão. O juízo de Deus sobre o pecador se dá na morte em si, e não em sua forma. Logo, não nos cabe julgar como “mais pecadores” aqueles que morrem de forma trágica, atribuindo o juízo a essa forma de morte, uma vez que sem arrependimento, todo pecador perecerá eternamente.
Compartilho uma experiência que tive com relação a esses sentimentos de justiça própria. Há alguns anos um amigo de infância foi brutalmente assassinado. Senti em algumas ocasiões profundo ódio pelo assassino, maquinando as piores formas de punição e morte para ele. Orei a Deus e pedi que tirasse aqueles sentimentos do meu coração, e roguei a Deus por justiça sobre a vida daquele bandido, bem como o seu perdão sobre seus pecados. Não fui incoerente em minha oração, uma vez que a justiça que lhe era devida, ainda que fosse a pena de morte, caso fosse essa a lei desse país, não me isentava de rogar que ele fosse ao mesmo tempo contemplado com o dom do arrependimento para salvação de sua alma. O jovem assassino, depois de julgado e recolhido a prisão por um tempo, recebeu liberdade condicional logo depois. Descumprido a exigência da sua pena, ele morreu pilotando uma moto em alta velocidade de madrugada. Alguns amigos celebraram a morte daquele rapaz, dizendo que Deus havia feito justiça. Confrontei esses amigos com o pensamento que expus nesse texto, sabendo que mesmo Deus tendo trazido juízo sobre esse assassino, isso não podia ser motivo de satisfação para nós.

O bandido que estava ao lado de Jesus na cruz, evidenciou seu arrependimento nesses termos (Lucas 23.39-43). Ele reconheceu que seu lugar era ali, morrendo na cruz por conta de seus crimes. Mas ele também creu que aquele que estava ao seu lado era o Messias, e que nele havia esperança de um reino vindouro. Jesus lhe disse que naquele mesmo dia eles estariam juntos no paraíso. Aquele criminoso morreu de forma trágica, em uma cruz, mas mesmo assim foi salvo mediante a fé no Rei dos reis. Devemos assim testemunhar aos perversos essa mesma esperança no nome de Jesus, que morreu de forma escandalosa a fim de que a morte não fosse mais uma tragédia na vida daqueles que pela fé se arrependem dos seus pecados.   

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